Os mesmos subsídios, que afinal pouco pesam na fatura da eletricidade, ajudaram ao desenvolvimento tecnológico que hoje permite ser mais barato produzir a sua própria energia que utilizar a da rede.
“Quem, de todos os que de alguma forma estão ligados ao setor das renováveis, nunca foi confrontado com a acusação habitual às renováveis? “A eletricidade é cara e a culpa é das renováveis”. Mas a resposta é “não”.
É sempre mais fácil apontar o dedo a um culpado único, e criar um “inimigo” comum, mas não é o caso.
É sabido que temos eletricidade cara, mas uma análise cuidada mostra-nos que não é bem a eletricidade renovável que está a encarecer a fatura paga pelas nossas casas e empresas.
Começando pela comparação Europeia, é também frequente ouvirmos dizer que temos a eletricidade mais cara da Europa. Os dados do Eurostat para 2015 indicam que, em pelo menos oito países Europeus (Reino Unido, Liechtenstein, Chipre, Espanha, Eslováquia, Grécia e Irlanda) as empresas pagam mais pela eletricidade que as empresas portuguesas. O mesmo sucede em Itália, Espanha, Irlanda, Dinamarca e Alemanha onde as famílias pagam mais pela eletricidade que as famílias portuguesas. Nos dois casos temos Portugal ligeiramente acima da média da zona Euro, mas não podemos, no entanto, esquecer que há custos externos imputados à conta da eletricidade que contam para os efeitos estatísticos de Bruxelas. Na verdade, os mesmos dados do Eurostat mostram que somos o terceiro país com o maior acréscimo à conta da eletricidade, fruto de IVA e outras taxas não relacionadas com percurso desde a produção ao consumo de eletricidade, como a afamada taxa de contribuição audiovisual.
Alguns argumentarão que, em paridade de poder de compra, a nossa eletricidade é a mais cara (ou das mais caras), mas importa ter em conta que na eletricidade se compete um mercado de “commodities” e que, mesmo no caso da produção renovável, os custos de painéis fotovoltaicos ou turbinas eólicas não têm porque ser mais baixos em Portugal do que em Espanha, Alemanha ou Reino Unido.
Há ainda outro fator determinante no preço da eletricidade que devemos ter em conta. Para evitar que os custos da eletricidade consumida pela indústria aumentassem, decidiu-se a certa altura que o sobrecusto das renováveis seria imputado apenas aos consumidores domésticos. Assim, se olharmos para a decomposição dos Custos de Interesse Económico Geral (CIEG) – a componente da eletricidade onde estão incluídos todos os custos que não dizem respeito ao processo de Produção, Transporte, Distribuição e Comercialização de eletricidade – temos que para um cliente e Média Tensão, os CIEG têm um peso de 17% da fatura, dos quais o sobrecusto da Produção em Regime Especial (não-renovável) representa 33% e em regime ordinário (centrais térmicas e hídricas) representa 37%.
No caso da Baixa Tensão Especial os CIEG ascendem a 22% mas continuam a não compreender os custos dos subsídios às renováveis.
É nos clientes de Baixa Tensão, tipicamente habitações ou pequenos negócios, que o custo dos subsídios às renováveis é revertido. E aqui sim o argumento de que culpa é das renováveis cai por terra. A Produção não-renovável em Regime Especial pesa 11% dos CIEG, o sobrecusto da produção em regime ordinário (hídrica e térmica) ocupa 40% dos CIEG enquanto a Produção renovável em Regime Especial tem um peso equivalente a apenas 9% dos CIEG, a fatia mais pequena.
Mas há mais. Os mesmos subsídios, que afinal pouco pesam na fatura da eletricidade, ajudaram ao desenvolvimento tecnológico que hoje permite ser mais barato produzir a sua própria energia que utilizar a da rede.
Enquanto outras fontes de energia ou distribuidores irão manter o argumento dos elevados custos de manutenção do sistema ou da importância da garantia de potência, as renováveis vão contribuir para uma redução dos custos da energia na rede, como fazem já em autoconsumo. E a muito curto prazo.”
Versão original publicada em 25/02/2016 no Observador